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Executivos ouvidos pela reportagem consideram que Banco Central teria favorecido fintech em discussões regulatórias; Campos Neto diz que agenda era ‘institucional’, e Nubank não se manifestou
Campos Neto ainda não aceitou cargos oficialmente, mas afirmou que está disposto a aceitá-los assim que a quarentena acabar Foto: Gabriela Biló/Estadão
A chegada de Campos Neto ao Nubank, caso seja confirmada ao final do período de quarentena cumprido após deixar a presidência do Banco Central, causou desconforto nos bastidores.
Pessoas que atuam em três bancos ouvidas pelo Estadão/Broadcast sob anonimato consideram que haveria um potencial conflito de interesse.
Esses executivos, dois de grandes bancos e um ligado a uma instituição de porte médio, consideram que o mandato de Campos Neto à frente do BC teria favorecido a fintech em discussões regulatórias.
Campos Neto foi convidado para integrar a diretoria e o conselho do Nubank e informou que pretende aceitar a proposta para atuar como diretor de Políticas Públicas, vice-chairman e membro do conselho.
A quarentena se encerra em 1º de julho.
À reportagem ele rebateu as críticas, disse que a agenda do BC é “institucional” e que gerou “democratização dos serviços financeiros”, além de ter beneficiado “milhões de brasileiros”,
Procurado, o Nubank não se manifestou.Para um dos executivos ouvidos, havia muita abertura ao Nubank em pautas no BC na gestão Campos Neto, independente da Associação Brasileira de Bancos ou da Febraban, que representam o setor. Outra pessoa afirmou que houve uma “cruzada” contra bancos tradicionais.
Embora não seja a única fintech de grande porte do País, o Nubank é de longe a maior delas. Por isso, na visão dos bancos, teria sido a mais favorecida pelas mudanças de regulação feitas pelo BC.
Na gestão de Campos Neto, o regulador colocou no ar o Pix, sistema de pagamentos instantâneos que vinha sendo desenhado desde a gestão Ilan Goldfajn. Entre outras funções, o Pix se tornou um vetor de transferência de depósitos para as fintechs, ao facilitar e derrubar a zero o custo para que os clientes levassem dinheiro de uma instituição a outra.
Pessoas próximas às fintechs apontam argumentos em contrário, ou seja, de que o BC teria sido mais rigoroso com o Nubank. Também durante o mandato de Campos Neto, foram publicadas duas regras mais duras que, na visão de agentes do mercado, miravam o forte crescimento da fintech, àquela altura já com capital aberto.
A primeira, em março de 2022, foi a que aumentou a exigência de capital para as instituições de pagamento. À época, o Nubank estimou que as regras definitivas eram de 10% a 15% mais duras do que se previa na consulta pública inicial.
Mais tarde, naquele mesmo ano, houve a aplicação de um teto para a tarifa de intercâmbio nas transações com cartões pré-pagos, que era uma fonte de receita relevante para a fintech. À época, o Nubank estimou que a mudança teria um impacto de cerca de 2,9% em sua receita total.
Não há ilegalidade na entrada de Campos Neto no Nubank após o período de quarentena. O ex-presidente do BC ainda não aceitou cargos oficialmente: ele afirmou que está disposto a aceitá-los assim que a quarentena acabar. Só depois disso haverá assinaturas de contrato e demais formalizações, como determina a regra.
Ao Broadcast, Campos Neto reforçou que a agenda do BC é “institucional” e tem como objetivos “gerar inclusão, competição e sustentabilidade”. “Os programas e projetos que foram feitos têm gerado uma desconcentração e uma democratização dos serviços financeiros.
“Milhões de brasileiros são beneficiados neste processo”, respondeu. “O programa segue após a minha saída com muito sucesso, e tem metas ambiciosas e engajamento total do quadro de funcionários.” O ex-presidente do BC afirmou que, com a agenda conduzida na sua gestão, o Brasil “tem sido referência mundial em inovação e modernização.”
Ex-presidentes do BC
Ex-presidentes do Banco Central, como Armínio Fraga (1999-2003), também retornaram diretamente ao mercado após deixar o comando da autoridade monetária.
Já outros, como Alexandre Tombini (2011-2016) e Ilan Goldfajn (2016-2019), antecessores de Campos Neto, tiveram trajetórias diferentes após deixar a autarquia.
Ainda em junho de 2016, após o impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), Tombini assumiu o cargo de diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI). Em 2019, ele migraria para o posto de representante-chefe do Banco de Compensações Internacionais (BIS) para as Américas.
Ilan deixou o posto em fevereiro de 2019, sendo sucedido por Campos Neto. Após cumprir a quarentena, virou presidente do conselho do Credit Suisse no Brasil. Ele ocupou o cargo até setembro de 2021, quando se tornou diretor do Departamento para o Hemisfério Ocidental do FMI. Em novembro de 2022, assumiu o posto de presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que ocupa até hoje.
Também egresso do mercado financeiro, Henrique Meirelles (2003-2011) aceitou um convite para presidir o conselho da Autoridade Olímpica dos Jogos do Rio depois do fim da sua gestão. Em 2012, passou a ser o presidente do conselho consultivo da J&F, e a integrar o conselho da Azul.
Em 2016, teve breve passagem pelo comando do Original antes de assumir o Ministério da Fazenda no governo de Michel Temer.
Na sua autobiografia, Meirelles relata ter sido sondado para presidir o Goldman Sachs no Brasil e servir como chairman do seu conselho consultivo internacional, mas diz que não pôde aceitar o convite por causa da demora da Advocacia-Geral da União (AGU) para liberá-lo.
Armínio Fraga presidiu o BC de 1999 a 2002, depois de passagens por instituições financeiras como Salomon Brothers e Soros Fund Management. Após encerrado o período de quarentena pós-fim da sua gestão na autoridade monetária, criou a gestora Gávea Investimentos, da qual ainda é sócio.
Antecessor de Fraga, Gustavo Franco (1997-1999) trabalhou na academia e no governo — inclusive como diretor da própria autoridade monetária e secretário-adjunto de Política Econômica da Fazenda — antes de assumir a chefia do BC.
Após o fim do seu mandato, voltou a dar aulas na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e na Universidade de Stanford. No ano 2000, fundou a Rio Bravo Investimentos.
Redação CNPL sobre artigo de e Matheus Piovesana e Cícero Cotrim Broadcast
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